domingo, 7 de outubro de 2007

Meu Blues para Você.

(Ao som de : Groaning The Blues - Eric Clapton)
"Sei mais do que aquilo que posso exprimir em palavras, e o pouco que posso exprimir não o teria exprimido se tivesse sabido mais." Vladimir Nabokov


Meu amor, não é nada. Não se preocupe, não é frieza. Apenas sou eu transvestida de medo e de incertezas. A incerteza da próxima nota de um blues. Não preciso dizer que esses seus momentos Strawberry Fields Forever já estão me cansando. Sua sensibilidade de plástico me dá enjôo. Não há Clarices ou Virginias que me façam encontrar em você o que me falta. Quando você me diz que sou seu mais belo poema em versos brancos, vejo que nem de poesia você entende.
Estou exausta. Já não te conheço mais ou talvez nem o tenha conhecido. Impressões se apagam.
Todas as noites aquela repetição de versos decorados. Você me chama para tomar um vinho barato, acender um cigarro e falar do que vem a ser o ultra-romantismo, quem sou e quem és. Nosso papel na existência humana.
Hoje percebo que tudo que você é, meu caro, é apenas um recorte dos seus escritores preferidos. Aqueles escritores que rodaram o mundo transpirando poesia. Uma poesia, um suor que te falta.
Seu sorriso me assusta assim como o meu silêncio te mata aos poucos. Sua dúvida te corrói porque meu sentimento apenas te traz mais incertezas. Dúvidas que meus versos te mostram. Cada linha de um verso meu é a afirmação de que você não sabe se me tem. Eu não,não vou dizer que te amo porque já não sei. Você destruiu a minha certeza quando vi que teus versos, tuas cartas, teus diálogos eram farsas. Tudo, tudo era mera cópia dos Românticos e Modernistas.
Você diz que gosta das incertezas...such a nice joke, dear.
Você quer ser vanguardista.
Não, meu amor, não moramos em Londres e nem fazemos parte do Bloomsbury Group. Hoje não tivemos dinheiro nem para comprar nosso maço de cigarro de baixa qualidade.
Não me cobre algo que você não sabe o que é. Não destrua a minha busca.
Tua poesia indefinida é apenas uma fuga para um grande encontro de versos, de um grande soneto.
Tua respiração está cansada porque teus versos também estão. Você não sabe de onde mais tirar palavras porque sua vida literária já está se esgotando. Serás comum, coisa que nunca admitiu ser. Cansei de ouvir sobre suas conquistas. Todas personagens criadas. Tudo culpa daquele escritor russo.
Acenda um cigarro, tome seu típico café amargo e requentado que de nada vai adiantar.
Não tente descobrir quem eu sou porque é claro demais. Pare de me chamar para ficar ao seu lado. Você não sabe ter ninguém ao lado. Não reclame então a minha ausência. Sempre estive aqui, ao seu lado, nos meus versos. Aqueles que você faz de conta que lê. Luto e as palavras são as minhas aliadas mas a tentativa de mostrar, através delas, coisas que nem eu sei direito já está me deixando cansada.
Meu amor,poderíamos ser juntos mais que um poema. Poderíamos todas as noites fazer nosso próprio movimento literário despidos em baixo dos nossos cobertores baratos. Eu, você, nossas dúvidas e certezas. Nossas vontades não rimadas. Nossa bebida barata. A fumaça tomando conta do quarto. O nosso blues tocando.
Você diz que eu não te entendo. Que não sei te sentir. E você, sabe o quanto sou simples? Sabe o quanto deixaria você me engolir toda com um beijo teu?
Tudo isso seria muito melódico, mas meu amor, você é covarde para assumir a poesia que você quer escrever.
Como disse, estou cansada. Vou sair um pouco. Andar e mais uma vez me perguntar qual vai ser meu próximo verso. Sei que você vai estar aqui quando eu voltar.

E. Alvarez

13 comentários:

Anônimo disse...

"Serás comum, coisa que nunca admitiu ser", é o que todos tememos, meu bem. Mas é o que já somos.

Roberto Denser disse...

Esse vai pra minha coleção.

Unknown disse...

Lembrou-me - realidade - a poesia de uma certa noite, dias atrás...e - ficção - algum texto de Caio F. A., também parte "daquela" noite linda de lua "laranja"!

Anônimo disse...

"Poderíamos todas as noites fazer nosso próprio movimento literário despidos em baixo dos nossos cobertores baratos"

Letícia disse...

Sou sincera, vou logo dizendo. É a primeira vez que leio algo que você escreveu que me parece ter vindo do seu eu lírico. Antes tudo me soava meio tímido - meio quase seu. Agora me parece que vc encontrou o caminho. Claro que quando escrevemos, catamos todas as imagens de livros já lidos e pessoas que conhecemos, mas esse texto traz a sua marca. Eu digo que é muito bom - outros podem não achar. No entanto, escritores nem sempre agradam. Não é esse nosso objetivo maior. Já que encontrou o caminho, se liberte ainda mais. Bons textos podem surgir e sua realidade inventada será sempre sua.

Letícia

Anônimo disse...

Intenso, sincero, provocativo, demolidor... :)

isa disse...

que bonito. não sei escrever assim. :õ)

Anônimo disse...

Cara, Teu blog é mais comentado que revista de fofoca. :S

Anônimo disse...

"...coisa do destino ou não, comentei no post errado...Mas não tenho muito o que falar agora, estou digerindo...digerindo..

Zélia disse...

Finalmente,apareci.Acho que era este o texto do qual você me falou.Me pareceu um grande desabafo e isso,na minha opinião, é muito bom.Em se falando de amor,não há razão para deixarmos o verbo preso...

VaneideDelmiro disse...

Visito regulamente o seu blog, talvez porque o que vc posta, autoral ou não, sinto um pouco como meu...
Adoro a sua escrita.
Vaneide

Iris Helena disse...

preciso me lembrar de nunca ler textos assim ouvindo musica triste. Porque essa combinação leva a precisar de lenços e pepinos nos olhos no dia seguinte. Lindo!


:*

Cla disse...

Nossa!Parabéns pelo texto.Vc escreve muito bem.Continue! =)