sábado, 12 de julho de 2008

Maquiamento


(Foto: steam train by jinnwoo - Deviantart)

A noite começa e te engole.Você apenas ouve o barulho da guitarra chorosa que se confunde com a melodia triste do seu fim de noite. A falsa alegria regada a notas musicais e bebidas coloridas já não te satisfazem. Você busca ir além. Busca naquele sorriso tímido e bruto uma resposta para teus sentires confusos e atemporais.
O sorriso se desfaz em gritos amargos e musicados. Você não entende e quer mais. O mais parece não vir e a dúvida faz seu corpo desfalecer. Você quer a noite, mas a noite te escraviza.Seu corpo quer se livrar da dor que te sustenta. Suas palavras musicadas lembram uma solidão tímida que você tenta disfarçar, brindando com falsos amigos mais uma dose de vodka barata. Acende seu cigarro. Ah ...o seu cigarro...Penso que "tenho ciúmes deste cigarro que você fuma tão distraidamente”, já dizia Ana Cristina César em meio à dores e desamores. E você fuma e fuma e fuma, tentando tragar o seu quase e maquiado não entendimento. Já não adianta fugir porque você sabe que é diferente de tudo aquilo ao seu redor mas ainda assim você precisa daquela luz quase neon, quase lilás. Elas disfarçam o que você sente. — Mais uma dose daquela bebidinha— você diz, olhando para o relógio e tentando esquecer as mazelas possíveis do dia seguinte. Tenta esquecer o seu vazio e as luzes que já estão quase se apagando. Você busca lábios fáceis e abraços descartáveis para esquecer a possibilidade dos ternos e quase eternos momentos que poderia ter com a moça que mal sabe da sua existência. Você a vê e quase chora. As lágrimas são escondidas com a aquele seu sorrisinho maroto e seu cigarro no canto da boca. Ah... o seu cigarro...
Você começa pensar nas possibilidades de amor jogadas fora e nos copos de álcool que você teve que beber para driblar a dor. A noite está quase acabando e você está ali, a meia luz, sentado naquele sofá rindo das piadinhas baratas dos falsos amigos. Você se pergunta como vai voltar pra casa. Você não tem mais dinheiro no bolso. Dinheiro serve pra fazer esquecer, você sabe.
Você não tem quem te abrace ao chegar.Seu pai já morreu, sua mãe já casou com um Italiano,seu amor nunca existiu e seu cachorro foi para casa do vizinho. Você não quer voltar e encontrar a cama suja de cinzas e nem lençóis manchados de vinho. Você quer andar, vagar pelas ruas para não se encontrar. Não adianta. Você tem que ir. Tem que chegar em casa mesmo sujo de vômito.Você tem que esquecer, você tem que esquecer a dor. Você chega, abre a porta, chora, coloca Joy Division pra tocar. Chora mais e troca o cd. Você precisa é do The Smiths, porque talvez There is a Light That Never Goes Out, baby.Você chora e nem sabe mais o porque das lágrimas. Não quer pensar, não sabe, só sente. Tenta escrever e não consegue. Os versos te fogem. Você levanta com sacrifício do sofá, abre a porta da sala. Já é dia. Você sabe que tem que vestir seu paletó e colocar sua melhor gravata para impressionar na venda do plano de saúde. Você com sacrifício se lava. Você chora pela última vez antes de sair de casa. Engole o café amargo e pega o ônibus. Você ouve a mulher de vestido rosa falar do capítulo da novela das oito. Você desce do ônibus. Você tem que entrar no escritório. Não há mais lágrimas. Você fabrica um sorriso. Você vai, entra, mas antes acende o seu cigarro. Ah... o seu cigarro...

E. Alvarez

terça-feira, 8 de julho de 2008

Felicidade em doses Homeopáticas

(...)
- Não, não sei. Já disse que não sei.
- Quando você vai saber?
- Talvez nunca.
- Mas se não for agora, pode não ser mais.
- Sinto.
- Sente o quê?
- Um lamento.
- Mas você quer viver assim?
- Não. Assim vai ser só dor com pinceladas de prazer ou vice-versa.
- E de outro jeito é só frustração.
- Não há como manter esses sentires todos intensos e desordenados.
- E então? A gente se larga e se dói? Ou a gente fica perto e vive de felicidade em doses homeopáticas?
- Não, não sei. Já disse que não sei.

E. Alvarez