"Radiosa me sorri
se minha boca fere.
Não sou um pastor doce
como em contos de fadas,
mas um lenhador que comparte contigo
terras, vento e espinhos das montanhas."(Pablo Neruda)
Permanecia sentada. Quase imóvel. Demorei a percebê-la. Não sabia se ela gostava do Neruda ou do Bandeira, se ela gostava de azul ou de rosa. Não sei o porquê da minha demora em percebê-la e nem sei se é preciso ter pressa para perceber coisas.
Imaginei se ela era de touro ou de virgem. Se gostava de maçã ou de pêra. Enquanto meu pensamento se perdia olhando para sua nuca desenhada, ela permanecia ali parada, ali quase imóvel.
Ela não falou comigo. Se falase o que teria a me dizer? Imaginei se ela era de Chico ou de Caetano, rubro negra ou fluminense.
Em tudo isso eu pensava enquanto alguém se aproximou dela e pude perceber de longe seu primeiro sorriso. Pensei: Gosta do Almodovar ou do Woody Allen?
A praça estava cheia e ela já não era imóvel e quem a acompanhava já ali não estava. O qua ainda fazia ali? Comeria pipoca ou algodão doce?
Pensei em ir falar com ela e perguntar se ela prefere o céu azul ou cor de crespúsculo.
Levantei peguei uma florzinha rosa do jardim e fui até ela. Ela me recebeu com um sorriso singelo, daqueles que parecem um poema da Florbela Espanca. Ainda não sabia se seria doce ou salgado.
Passamos a tarde juntos, conversamos sobre cores, sabores e da atmosfera daquela praça. Rimos juntos. Senti a presença de borboletas azuis no meu estômago. O céu estava tão amigo que esboçou uma mancha de arco-íris. O dia já estava quase acabando quando alguém se aproximou,a pegou pelas mãos e beijou levemente seus lábios. Neste momento as borboletinhas azuis batiam as asas bem devagarinho e me deixaram com enjôo. Ela se despediu de mim com um sorriso.
Levantei do banco de madeira, comprei um saquinho de pipoca.Doce ou salgada? Não lembro. Fui para casa. Nunca soube o quê se seríamos juntos. Nunca soube se ela era Yin ou Yang.
E. Alvarez
*Escrito ontem no ar e sob algum mar. ( A caminho de São Paulo)